Alguns anos atrás, eu decidi me submeter a
um processo seletivo de uma instituição privada daqui do Estado. Eram 20
candidatos – quase todos já professores - para uma vaga de Direito do Trabalho. Eu queria muito aquela vaga e estava seguro de que poderia consegui-la. Só dependia de mim. Fiz a prova didática, aprovado em primeiro lugar, entrevista, aprovado em
primeiro lugar, prova de títulos, primeiro lugar. Finalmente fui submetido a
uma entrevista com uma Psicopedagoga, uma daquelas pessoas altivas, que passam
a sensação de estarem analisando até sua quarta geração ascendente, com um
olhar de total e pleno domínio sobre os mais sombrios aspectos da sua
personalidade. De uma teatralidade sartriana que justifica o personagem que a
convenceram ser. Tudo se resumiu a fazer uns desenhos sobre um ambiente de
aprendizagem, meia dúzia de perguntas aparentemente sem fundamento. Ao final,
fiquei em segundo lugar na seleção e não sabia o porquê. A indignação tomava
conta de mim. De nada me adiantara ter uma didática impecável, as muitas
publicações e postura solícita na entrevista. Fui reprovado por alguma autodenúncia imagética decorrente da minha inabilidade no desenho? Dois meses
depois eu me submeti a um exame de seleção e fui aprovado num programa de
doutorado na UFPB, que me abriu oportunidades muito mais interessantes. Se eu tivesse sido contratado, certamente teria que pedir
demissão com 1 mês de trabalho, causaria um prejuízo à instituição, uma
vergonha a mim pela ruptura repentina do contrato de trabalho e um
constrangimento restaria na minha relação com a faculdade.
Essa pequena história me serviu para tirar
algumas lições. Por melhor que você se julgue ser e seja, o mundo não funciona
com base nas nossas bases de retidão. Ele tem uma capacidade indizível de
agressão. Em última instância, ninguém é obrigado a gostar da gente, por mais
mérito que (supostamente) tenhamos. A (in)justiça é uma realidade que se
atravessa entre nossas mais latentes verdades e por mais que não creiamos, uma
série de ‘nãos’ podem ser apenas a preparação para um grande sim. O inverso
também é verdade, de modo que não há fórmulas para essa grande surpresa diária
que é viver.
Aquilo que você reputa ser a causa do seu
fracasso pode ser o início de um grande sucesso. Você não precisa saber a razão
de tudo. Como diria Fernando Anitelli, vocalista de Teatro Mágico, na música
Sonho de uma Flauta:
2 comentários:
Você tem o dom de escrever uma coisa que me faça pensar sobre varias outras.
Muito bonito o texto. Reflexivo.
1beto, desculpe desapontá-lo, mas o que o sr. chama de 'autodenúncia imagética decorrente da minha inabilidade no desenho' tem um sinônimo bem popular: 'peixada'.
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