sábado, 27 de dezembro de 2008

Cinco minutos

Se está difícil sobreviver, imagine viver – dificílimo. Estar vivo e são chega até a ser um ato de heroísmo diante de dias tão conturbados e estranhos, como diria Rodrigo Levino. De duas semanas para cá vi temporais ceifando famílias inteiras, aluno ameaçando professora, reclamado em vias de esfaquear magistrado, pessoas admitindo seu cansaço e impotência diante de tantas circunstâncias e por aí vai. A humanidade emite sinais de agonia e dor.

Manter-se em pé mesmo enfrentando as mais variadas adversidades demanda forças celestiais. As pedras surgem aos montes e algumas delas, independente da oposição que encontram, insistem em acomodar-se se não no caminho, dentro do sapato. Porém, há momentos que as resistências queimam, as energias cessam e nosso mundo aparenta desmoronar, transformando tudo em pó e angústia. A premissa pode ser aplicada a toda e qualquer área de sua vida, desde a dificuldade de suportar o hematófago noticiário, até aquele instante particularmente considerado quando, sem motivos aparentemente plausíveis, sucumbimos ao resultado de meses, anos de angústia, inconformismo e mutilação da alma.

Fugir das intempéries é inútil, senão mais cansativo ainda. Explico. Para fugir, é necessário empreender esforço, gastar parte da vida, investir tempo e disposição. Se levado em conta a realidade a velocidade da dinâmica social, percebe-se facilmente o quão rápido tudo pode acontecer e desacontecer sem que haja tempo para uma reação apropriada. Ou seja, é necessário atravessar o rio das dores com o cuidado de não pisar duas vezes no mesmo lugar, como já comentava o historiador grego Heródoto.

É na qualidade da travessia onde está a cura. Caminhar é preciso. Arrebentar-se, sangrar, prostrar-se e reconhecer que por trás de um ser deveras inteligente, tecnológico e que fracassadamente tenta sempre estar no controle de tudo há uma figura cansada e necessitada de descanso espiritual é imprescindível. Portanto, arregimentar estímulos e ir adiante é o mais sensato. Inegável a aspereza e estafa do trilhar fluviométrico. Alguns desistem, entregam-se e niilisticamente subscrevem o termo de vencidos, subtraindo de si a oportunidade de tentarem uma vez mais. Preferem um descanso desconhecido ao dom de viver.

Absorver os efeitos cicatrizantes da dor é parte do tratamento. Há uma película chamada Tudo acontece em Elizabeth Town e dela faço uma paráfrase “caia, curta os cinco minutos do seu sofrimento, levante-se e caminhe”. Infelizmente, há uma convenção velada de seres humanos imbatíveis, os quais não podem dar-se ao prazer de aprender com suas perfurações sentimentais. Sempre há alguém dizendo "não chore", "você tem que ser forte", "saia, divirta-se, seu mal é depressão" (uns com razão, outros por simples idiotice – no conceito psicológico da palavra). De paliativos a sociedade está cheia. Dia a dia empanturram-se os humanos com seus anestésicos sociais e em vão o fazem.

Ruminar a dificuldade é ser ensinado e ter ciência da falibilidade individual. O reconhecimento de uma condição de ser vulnerável e  da realidade de estarmos no mesmo nível dos nossos desertos implica aceitar que é possível vencer as batalhas contra eles, mas também ser derrotados, com uma esperança de levantarmos posteriormente.

Quando se aproveita em detalhes tudo aquilo capaz de ser proporcionado pelos ditos cinco minutos, os quais podem durar semanas, meses, anos ou apenas trinta segundos, ergue-se sempre um indivíduo mais nutrido e emocionalmente sagaz para as próximas guerras. E, nesse caso, é levantar sabendo que pode-se arrear novamente, entretanto com a certeza de que enquanto tudo não cessar, não cessaremos.

LUCENA FILHO

Um comentário:

Lauro Ericksen disse...

esse omi tá muito existencialista hj...
ahauhauhauahua